top of page
Blogs.png
Buscar

EU ME LEMBRO DE VOCÊ - ANTES DAS RUÍNAS - PARTE 2

Foto do escritor: DIDI ANDRADEDIDI ANDRADE

Óculos Fundos era o ser mais interessante que eu já tinha conhecido. Eu adorava ouvi-lo contar suas histórias, sempre tão incríveis, de todas as aventuras que ele passou em suas viagens.


Ele também adorava contar.


Falava sobre suas descobertas quando nos deitávamos sob a sombra da árvore da campina, estávamos, os três, cheios e sonolentos demais do piquenique que tínhamos feito mais cedo. A letargia era grande demais para fazer algo além de dormir e conversar e era exatamente isso que fazíamos.


Ele também contava da Torre Torta quando andávamos pelas ruas da cidade, nos sentando onde houvesse um espaço bom e uma vista bonita para passar o tempo papeando.


Aparentemente, ele tinha crescido lá dentro.  Foi patrocinado* em suas viagens e voltou porque, aparentemente, uma vaga entre os superiores havia se aberto, e ele tinha sido convocado misteriosamente.


Um silêncio estranho sempre se instalava quando ele mencionava isso. Eu nunca soube dizer se era pelo desconforto de Canarinho sobre a Torre ou… bem, quando Óculos Fundos contou que o cargo ficava em um lugar muito, muito distante.


Felizmente, isso nunca parou as outras conversas deles, eles voltavam a se falar como se nada daquilo existisse.


Meus humanos conversavam em nossa pequena toca…


Em cima de telhados que apresentei…


Fora e dentro da cidade…


Em todos os lugares.


A atenção e o carinho que voltei a receber de ambos eram tão bons, que mesmo o incômodo recente que tinha sentido ao ver Canarinho, tinha abrandado. Parecia como os velhos tempos agora, quando éramos só nós dois e nossas existências. 


Claro, éramos três, agora.  Eu amei cada mísero segundo.


Apesar de Óculos Fundos ter se sentido claramente incomodado com o estado que encontrou Canarinho, ele não tentou tocar no assunto tantas vezes, optando por respeitar o silêncio do outro humano quando este se calava. Entretanto, ele fez claramente o que eu mais desejava que ele fizesse: todos os dias, ele batia à nossa porta. E todos os dias, ele conseguia tirar Canarinho de dentro de casa. 


Como eu amava esse humano.


Suas visitas foram ficando cada vez mais frequentes até que, um dia, ele se mudou para uma toca quase ao lado da nossa. Eu morri de felicidade, era um vizinho que eu verdadeiramente desejava… Mas, essa não foi a reação que eu esperava de Canarinho. 


Ele surtou. Agarrou Óculos Fundos pelos ombros e os sacudiu desesperadamente:


– VOCÊ DEIXOU A TORRE TORTA?! Você está louco?! Por que você saiu de lá?!  Olha tudo o que você perdeu!! Você não disse?? Você ia ser promovido!! Por que...


– Bem… - O homenzinho coçou a nuca - eu apenas percebi que talvez meus ideais não estivessem tão de acordo com o deles, então…


Um longo silêncio se colocou entre eles… Então Canarinho o soltou.


– Idiota… - Ele soltou, se trancando dentro de nossa toca.


Nem Óculos Fundos, nem eu, conseguimos entrar em casa em boa parte daquela noite, até Óculos Fundos perder a paciência e invadir a toca… e me trancar do lado de fora.


Naquela noite, eu dormi olhando as estrelas.



_________


Patrocínio: Quando um humano se responsabiliza por todas as questões de vida de outro humano. Isso inclui casa, refeições, roupas e dinheiro. É bem importante para eles.






Não se esqueça de deixar um comentário, e seguir nossas redes sociais:






5 visualizações1 comentário

Posts Relacionados

Ver tudo

1 commentaire

Noté 0 étoile sur 5.
Pas encore de note

Ajouter une note
Invité
11 nov. 2024
Noté 5 étoiles sur 5.

Muito poético: “Em cima de telhados que apresentei…”

NAMASTÊ!

J'aime
bottom of page