Buscar
EU ME LEMBRO DE VOCÊ │CAPÍTULO VII - PARTE 12
Um Tesouro em uma árvore - Parte 12
- Não ouse me olhar assim, gato. – Disse Canarinho, a mão presa à maçaneta da porta* como material fundido*. – Eu não estou com medo de sair.
Lambo minhas patas, confortavelmente deitado em nosso ninho:
Eu não disse nada.
Quem estava ficando plantado na porta todos os dias, antes de sair, era Canarinho, não eu.
![](https://static.wixstatic.com/media/44bda1_4b1e4f84f75944868049c7c0c9f12930~mv2.png/v1/fill/w_980,h_637,al_c,q_90,usm_0.66_1.00_0.01,enc_avif,quality_auto/44bda1_4b1e4f84f75944868049c7c0c9f12930~mv2.png)
Uma semana* passou depressa.
Mas quem estava praticamente na velocidade oposta era Canarinho, antes de pôr os pés na rua.
Não que fosse uma coisa ruim, pelo contrário, fazia tempos que não me sentia tão contente:
- Eu não estou com medo de sair. Ouviu? – Disse Canarinho, sua voz, sóbria, ecoando em meus ouvidos pela milésima vez, naquela manhã.
Exatamente.
Canarinho estava, finalmente, sóbrio.
Como ele temia sair da toca, ele não pôs muito os pés nos lugares em que bebe álcool. Naturalmente, os efeitos da bebida também passaram.
Se pra Canarinho essa semana foi claramente uma tortura, eu estava no céu!
Um Canarinho sóbrio é tão mais fácil de lidar!
Ele é tão comportado!
Tão obediente!
Tão mais limpo!
Ainda fedia, mas não no nível de quando estava embriagado!
Também não precisava me preocupar com ele sujando a toca inteira depois de acabar em uma vala!
Mais que isso, ele me ignorava menos quando estava sóbrio!
Até mesmo ajudava na higiene da toca!
Claro que ele ainda usava aquelas roupas terríveis, tinha manchas horríveis debaixo dos olhos e olhava para tudo com aquela expressão de passarinho morto, mas não tem nem comparação para quando ele está bêbado!
Por mim, Canarinho poderia ficar dentro da toca a vida inteira!!!
Mesmo que ele pensasse o contrário.
Começo a limpar minhas orelhas.
- Não é que eu estou assustado! É só que aquele bastardo vai vir atrás de mim logo! – continua Canarinho.
Sim, sim. – Mio. Limpando minha bochecha – Ele deve vir hoje né? Já passou uma semana.
- Humpf! O que eu estou devendo pra ele? GOLPISTA! – Ele chuta a porta com força – APROVEITADOR! SANGUESSUGA! DESPREZÍVEL! CANALHA! – seus ombros tremiam – C-Como eu pude achar.... Ele-Ele é como todos os outros...!
Um silêncio se instaurou.
Me levanto de nosso ninho, me sentando ao lado dele:
Ei. – Cutuco sua perna com uma pata, ele me olha – Eu sei que você está com raiva dele, mas não precisa chutar a porta todas as vezes que o xingar, sabe?
Afinal, se ele estragar a proteção da entrada de nossa toca, como que ele ia impedir que aquele humano sem vergonha entrasse?
Canarinho me encarou, atordoado, por um tempo.
Até que um sorriso de auto zombaria preencheu todo o seu rosto.
- E agora aqui estou eu – ele se vira para encarar as próprias mãos, de sua voz, escorria desprezo para com sigo mesmo - reduzido a uns miados de um gato.
Ele encosta a testa na porta.
Me viro novamente, decidido a voltar a tomar meu banho em nosso ninho...
- Até você me despreza. – A voz de Canarinho, rouca e transbordante de... dor, fez com que eu parasse no meio do caminho. Me viro para ele.
- Até você zomba de mim. – Canarinho diz, entre dentes cerrados, o punho fechado fortemente contra a porta. – Eu.. não sou digno nem mesmo da companhia de um bêbado.
- Você me odeia também. Não odeia? – Ele se vira completamente, apontando o dedo para mim – ENTÃO POR QUE ESTÁ AQUI TAMBÉM???! POR QUE INSISTE EM ME ASSOMBRAR??? POR QUE NÃO VAI EMBORA DE UMA VEZ???
Um silêncio, cortado apenas por sua respiração ofegante, cobriu a toca mais uma vez.
No final, estávamos nos encarando.
Seus olhos, em desespero, refletindo a minha figura.
Sua respiração, entrecortada de sua autopiedade, chegando ao tato de meus pelos como sol fervente, ou um balde de água fria.
Por fim, com um suspiro, me volto para o canto em que ele mantinha suas roupas.
Eu não te odeio mais, Canarinho. – Mio, enquanto, em sacrifício, pego com minha boca uma bolsinha pesada e imunda.
Embora eu diga que quanto a companhia, - caminho até ele, sob sua expressão chocada – são eles que não merecem você. Não dá pra chorar pelo leite derramado.
Escalo o corpo do chocado Canarinho, parando em seus ombros.
Ainda temos dinheiro que eu sei, então não seja mesquinho. – solto a bolsa em suas mãos, as moedas tilintando com meus miados – pague o mínimo a esse homem. Então ele não nos incomodará mais.
Claro, também seria ótimo se ele se mantivesse afastado das bebidas.
Naquele dia, um atordoado Canarinho saiu comigo em seus ombros.
----------------------------------------------
maçaneta da porta: Um mecanismo que permite que portas de tocas ou demais objetos sejam puxadas com mais facilidade. Normalmente vem com uma fechadura, que mantêm o que está fechado, fechado. Para abrir, é necessário um mecanismo único e especial para inserir dentro.
material fundido: Dois materiais que se fundiram quando derretidos e secaram juntos.
Não se esqueça de deixar um comentário, e seguir nossas redes sociais:
![](https://static.wixstatic.com/media/44bda1_befc1ca761e74ea3a0e3f28dc61184e3~mv2.png/v1/fill/w_980,h_454,al_c,q_90,usm_0.66_1.00_0.01,enc_avif,quality_auto/44bda1_befc1ca761e74ea3a0e3f28dc61184e3~mv2.png)
1 Comment
Rated 0 out of 5 stars.
No ratings yet
Coitado do nosso gato que acreditou,por minutos,que Canarinho fosse ficar tranquilo.
Namastê!